2004-01-14

"...são só mais 10 cêntimos a cada um!" III

Popper faz também uma interessantíssima crítica ao relativismo que é sem dúvida um obstáculo de peso a uma sociedade aberta. Será assim tão difícil chegar a um consenso sobre o bem e o mal? Admito a dificuldade de nos libertarmos do preconceito e da moral que nos serviram no biberão, mas interessa-nos assim tanto essa abstracção e poder de encaixe? O bem e o mal derivam da propriedade humana de sentir, de pensar, de prever. “Matar é errado porque estou a privar uma pessoa do direito de gozar a sua vida, estou a privar a sua família da sua companhia, estou a provocar sofrimento. Consigo perceber esse sofrimento e que devo reciprocidade de tratamento para com o próximo”. Esta matriz de pensamento serve para uma infinidade de relações pessoais, diversas da imposição da morte. O resto… o mercado responde! Não é excesso de fé acreditar que um mau empregador perderá os seus colaboradores para um bom empregador. Que um monopolista com grandes lucros seja afrontado por imediata concorrência. Que um conjunto de pessoas se possam juntar numa cooperativa para fazer uma estrada para um sítio remoto, e a explorem, seja directamente seja por uma oferta genuína paralela que justifique a sua rentabilização. No limite, não acredito que fique algo _necessário_ por fazer se isso estiver dependente da iniciativa privada. Com a vantagem de ser julgado pelo mercado, com incentivos múltiplos a ser racional e a vender qualidade. A própria ciência e o mercado do conhecimento provaram ser domínio de privados que se especializaram!

A disposição conservadora de Oakeshott tem também um conjunto de revelações que iluminam a natureza do indivíduo e da sociedade. A assunção da falibilidade e imperfeição do homem é exemplo disso. Isso contraria directamente a possibilidade de encontrar um homem built-to-fit numa organização pura. Seja como for, é muito discutível que o hipotético homem perfeito quisesse ou servisse os propósitos de uma organização. Oakeshott faz também uma crítica ao racionalismo na política, baseado na evidência de não haver uma solução perfeita para um problema político. Com efeito, as circunstâncias também definem o problema, e estas mudam. A presunção de poder ‘tudo prever’ e ‘tudo racionalizar’ ou organizar é mais um objectivo longínquo dos defensores da planificação e da organização. A disposição conservadora seria baseada numa postura reservada quanto à mudança, de usufruto do presente e cautela quanto ao futuro e ao risco de se perderem conquistas consolidadas. “Não reparar o que não está avariado”. Esta posição pode parecer rígida e estática mas cuido que pode ser entendida de uma forma um pouco mais lata – Podemos fazer reparos marginais em avarias marginais e ainda assim respeitar uma postura conservadora. O risco de perda é assim reduzido e mais compatível com perfis de risco mais conservadores. Finalmente as actividades preferidas de um conservador: pescar e conviver com os amigos – meritórias pela propriedade de serem interessantes ainda que autónomas de outros interesses. O facto de não custarem um único cêntimo a um estranho na outra ponta do país também não é despiciendo.